A farmácia do seu Paschoal

Logo que o doutor saiu, a mãe pediu ao filho Dudu que fosse comprar os remédios da receita. Havia em seu tom de voz súplica e ao mesmo tempo ordem, a que o bom filho não podia deixar de atender.
Lembrou ainda a Dudu a recomendação do Dr. Júlio:
– Vá buscar os remédios na farmácia do seu Paschoal.
– Com que dinheiro, mãe? Os trinta centavos que eu tinha, ontem deixei no cofre das esmolas de São Vicente.
– Muito bem-feito! Traga ao menos uma aspirina.
– Tá bem. mãe.
Com a caixa de engraxate nas costas e dor no coração, Dudu caminhava incansável pelas ruas da cidade, atrás de fregueses, sempre apregoando os seus serviços:
– Uma graxinha aí, Doutor? Rápida e caprichada. Hoje, precinho especial.
Era tarde. Dudu não havia engraxado nenhum par de sapatos e precisava levar os remédios para seu pai. Indeciso, parou diante da farmácia do seu Paschoal. Nos bolsos, apenas a receita do Dr. Júlio. Nem um vintém. Como pedir os remédios fiado? Ele, engraxate, e filho de um aposentado que ninguém tinha interesse em conhecer?

II
Quem não conhecia na cidade o seu Paschoal, da Farmácia Vômero? Qual pobre, ao menos uma vez, não se valeu da grande experiência e bondade daquele que era mais médico que farmacêutico, mais santo que homem? Por qualquer indisposição, corriam à sua farmácia, e ele paciente e atencioso encontrava na prateleira o remédio certo para a cura ou alívio dos doentes.
O seu Paschoal costumava atender à clientela a qualquer hora do dia ou da noite, não por gana ao lucro, mas pela satisfação de prestar ajuda a quem na aflição nem sempre tinha outra porta a que bater à procura de socorro. Quanto mais fora de hora o procurassem, maior a sua presteza no atendimento e sempre com palavras amigas e confortadoras:
– Você não tem nada grave, amigo. Com este remédio, garanto que vai ficar ainda melhor.
Na calçada, à porta da farmácia, o seu Paschoal conversava com um velho amigo:
– Como está o movimento na farmácia, seu Paschoal?
– Bom, muito bom. Graças a Deus, hoje foi dia calmo.
– Por que graças a Deus, seu Paschoal?
– Graças a Deus, porque ninguém adoeceu grave, nem precisou de remédios…
– Assim, você nunca vai ficar rico – caçoou o amigo.
– Nunca pensei em ficar rico. Ganho pouco, mas o bastante para manter a família e ainda sobra para ajudar os que procuram a farmácia. Cobro o preço justo, às vezes a metade, ou nada, de quem não pode pagar.
– Eu sei de tudo isso, seu Paschoal. É tamanha a ganância pelo dinheiro que o homem não mede esforços para acumulá-lo a qualquer custo.
– Pois eu chego a ter pena do infeliz que precisa de muito dinheiro para viver – acrescentou o seu Paschoal.

III
O seu Paschoal viu Dudu parado diante da farmácia.
– Pode chegar, Dudu. Como está passando seu pai?
– Meu pai? Meu pai está doente…
– Eu sei. Você trouxe a receita do Dr. Julio?
– Sim, senhor. Está aqui comigo, mas…
– Mas o quê?
Dudu não respondeu logo. Depois, de cabeça baixa, disse que não podia levar os remédios da receita, não tinha dinheiro.
– Dê cá a receita, menino! Ninguém está falando em dinheiro.
O seu Paschoal ajeitou os óculos no nariz, voltou-se para as prateleiras e começou a separar os remédios e a anotar nos invólucros o modo de tomá-los recomendado pelo médico. Em seguida, embrulhou-os e os entregou a Dudu, dizendo:
– Leve os remédios para seu pai tomar agora mesmo. Se precisar de mais, volte cá. Entendeu bem, Dudu? Vá logo, correndo, correndo.
– Deus lhe pague, seu Pascoal.
Enquanto Dudu se afastava ligeiro e feliz com os remédios do pai, o seu Paschoal sorria, ainda mais feliz, sentindo-se bem pago pela oportunidade de juntar mais um bom investimento aos tantos que vinha fazendo.

Notícias Semelhantes