A surpreendente história de São Roque Regresso

Podemos dizer que a história de São Roque Regresso começou em 1881. Foi nesse ano que o casal José Leôncio Gut e Josefa Von Flüe, pais de Maria Gut, e José Ambiel e Ana Maria Shäli, pais de Inácio Ambiel, chegaram no Brasil, vindos da Suíça, de onde saíram com coragem impulsionada pela fé, na esperança de encontrar em terras brasileiras a prosperidade que a terra-mãe já não proporcionava.
Maria Gut casou-se com Inácio Ambiel e um dos filhos, nascido nessa nova realidade – a Colônia Helvetia – foi batizado como Eduardo Ambiel.
Em 1927 o casal mudou-se para um sítio em Indaiatuba comprado pela família de Maria Gut – que ficou viúva com 11 filhos. O sítio era chamado São Miguel, uma extensão de terra que somava quase 100 alqueires, que ia do cemitério da Candelária ao Jardim Morumbi (sentido sul/norte), pegando toda a extensão de onde hoje é a Vila Suíça, incluindo a Mata do Parque Ecológico; a porteira ficava onde hoje é a rotatória do Pastel da Feira.
Foi ali que Eduardo Ambiel e Josepha Von Zubem, que já tinham o filho José Ignácio, nascido em Helvetia, tiveram outros rebentos: primeiro, Terezinha. Nasceu depois Flávio, Lino Atanázio, Eduardo Júnior, Simão Luiz, Waldemar, Maria de Lourdes, Maria Apparecida, Cecília, Ruth, João Tadeu e Bernadete. Eram 13 filhos para criar.
A rotina do trabalho era dura: o uso de adubos químicos comprados era raro; o instrumental continuava sendo a enxada, foice e cavadeira, e quando a terra ficava improdutiva o único método de recuperação era o rodízio.
A fé sempre foi referenciada em todas as histórias contadas pelos suíços: crônicas, livros, relatos de memória oral, todos fazem referência à importância da religião católica para a consolidação da Colônia Helvetia e para a união dos helvetianos em uma comunidade essencialmente pacífica. E essa fé direcionou um grave problema que colocou em risco a sustentabilidade dos negócios de Eduardo Ambiel na década de 1930.
Foi exatamente em 1934. Uma peste começou silenciosamente ceifando a vida de alguns suínos. Logo começou a se espalhar. Como avaliar e tratar corretamente uma peste naquela época, sem acesso a veterinários, exames e remédios corretos? Eduardo não teve dúvida: foi consultar o vigário da Paróquia de Nossa Senhora da Candelária, o padre Luiz Soriano. Católico fervoroso, precisava de uma diretriz para salvar a criação de suínos.
Em 1932 o padre Soriano havia dado início a um processo de reforma na Matriz: removeu o assoalho velho de madeira e substituiu-os por mosaicos de cimento, colocou lustres, instalou iluminação no altar-mor e aumentou a iluminação dos altares da Imaculada e de São José. Dos lados, haviam os nichos, sendo que do lado direito já tinha um santo.
– Ore muito, peça para São Roque, protetor dos bichos contra doenças contagiosas. Ele vai te abençoar.
A crença na sua fé era tamanha, a certeza que sua prece seria atendida era tal, que Eduardo já perguntou para o padre qual seria o tamanho da imagem de seu ‘salvador’ que ele teria que doar para preencher o nicho. Os dois mediram a imagem de Santa Bárbara com um barbante – que estava do lado direito – ela tinha cerca de 80 cm. Foi, então, Eduardo para Campinas de ônibus, na casa de Dom Neri com o pedaço de barbante, solicitando indicação para a confecção da imagem de São Roque que, encomendada, viria do Rio de Janeiro.
A imagem foi doada à Igreja Nossa Senhora da Candelária, onde ficou no nicho até o final da década de 1960, quando o então pároco, o padre Hermínio Bernasconi, engajado na então chamada linha progressista da igreja católica após o Concílio Vaticano II, fez mudanças radicais na Matriz. Uma delas, a retirada das imagens em atendimento ao ‘Cristocentrismo’. Todas as imagens foram colocadas para fora da igreja, literalmente ‘jogadas fora’, menos a de Cristo e da padroeira. A família Ambiel achava que a história de São Roque havia terminado aí.
Depois de muitos anos, em uma conversa corriqueira, uma das filhas de Eduardo Ambiel, a Maria Apparecida, contou essa história para sua empregada doméstica Benedita Sampaio. Ela juntou a história da patroa com outra história que sua mãe – Benedita – contava, que havia pego uma imagem na porta da igreja, como tantas outras pessoas fizeram, e levara para casa. Era São Roque que, após um tombo, estava aos cacos, debaixo de um abacateiro. Sua mãe não havia tido coragem de jogar os cacos fora.
Maria Apparecida e a irmã Terezinha foram até a casa dela. D. Benedita já havia falecido, mas os cacos de São Roque, estes estavam lá, sob sol e chuva, nas intempéries de nossa Indaiatuba. As irmãs pegaram os caquinhos e entregaram para o restaurador João Colalillo, que com técnica e capricho, refez a imagem.
Ela foi dada de presente para o Eduardo quando ele fez 80 anos em 27 de setembro de 1981. As irmãs lembram muito bem a expressão emocionada do pai, que faleceu em 7 de maio de 1988.
– Será que é o Roque?
– O meu São Roque?
E até hoje, a filha mais nova, Bernadete Ambiel, guarda na sua casa, com devoção, a imagem de São Roque Regresso, que testemunhou não só a fé de seu pai, mas a história de luta e perseverança de muitas gerações da família.
Os suínos? Sim. Nenhum mais morreu após a oração de fé de Eduardo Ambiel.

Eliana Belo

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