Namoro à antiga

O meu namoro de mais de três meses com a Laura não passava da troca de discretos olhares, cumprimentos e acanhados sorrisos.Tudo a distância. Parecia um romance encruado, com a propensão de permanecer em tempo que eu não podia imaginar. Eu não ousava avizinhar-me dela na rua, com receio de causar-lhe problemas em casa, ou no colégio, se ela estivesse de uniforme. Terminada a guerra, minha baixa do Exército estava bem próxima, segundo informações do tenente Almeida: aproveite o tempo que lhe resta para namorar, sargento, porque seus dias no quartel estão contados. Sua baixa não deve tardar. Diante dessa informação, só me restava criar coragem e precipitar os acontecimentos. Vou visitar a Laura e conversar com seus pais – decidi, cheio de coragem e entusiasmo. Achei que não devia apresentar-me fardado. Talvez o doutor não apreciasse convocados e tinha razão. Segundo voz corrente na cidade, cumprido o tempo de Serviço Militar, os convocados voltavam à sua cidade e não se lembravam das namoradas que iludiram com mentirosas juras de amor e promessas de breve retorno.
No dia da visita, um sábado, 8 horas da noite, vesti o terno de linho branco que pedi emprestado de um colega. Não era o meu manequim, e não estava em condições de exigir outro melhor, nem sabia onde procurá-lo. Encaminhou-se para o consultório, abriu a porta e convidou-me a entrar. Mas, doutor, não vim consultá-lo. – Se não veio consultar-me, então, a que devo a honra da visita?
Bastou o sorriso e simpatia para conquistar-me e estou aqui para falar sobre minhas pretensões de namoro. O doutor sorriu . Chamou a filha: – Laura, visita para você. Conhece o sargento Alfredo?- Sim, pai. Só de vista – respondeu ela, muito encabulada com a minha nunca esperada presença em sua casa. Eu mantinha-me em pé. Por favor, sente-se, sargento – disse-me o doutor. A farda verde-oliva nivela todas as pessoas e torna-se difícil distinguir o caráter delas. A cidade tem recebido convocados de muitas partes do país. Cabe aos pais redobrar de cuidados. Você me está entendendo? Sim, senhor..Eu não tinha por que discordar do doutor. Limitava-me a ouvir e a dizer sim. Afinal, entendi com clareza que não se cria uma filha para entregá-la a qualquer forasteiro, antes de conhecer-lhe a origem, as condições financeiras e, principalmente, os dotes morais necessários para assumir tão séria responsabilidade para durar a vida inteira. Quando se dará a sua baixa? – Não deve demorar, segundo comentários no quartel. – Vocês são novos e mal se conhecem. Podem esperar algum tempo. Minha filha ainda está estudando. A Laura, coradinha, conservava-se calada, nem sabia onde fitar os olhos, se no teto, no pai, ou, a furto, em mim. Eu já estava aflito para que tudo acabasse depressa e pudesse ir embora com a permissão concedida.
O doutor, após breve silêncio, decidiu: – Vamos fazer um acordo, sargento Alfredo? – Sim, senhor. – Acordo fechado, doutor. Eu voltarei em breve. Muito obrigado por ter-me recebido tão amavelmente.
Despedi-me do doutor. Depois de Laura, com demorado aperto de mão e um sorriso dela. Dispensado do Exército, voltei para casa. Durante o namoro, à distância de cerca de 500 quilômetros de Belo Horizonte, toda semana eu recebia cartas de Laura e postava outras para ela. Valendo-me desse pretexto, e não querendo esperar mais, entendi-me pelo telefone com os pais de Laura, e eles aceitaram o meu inusitado pedido de noivado. Somente voltei a encontrar a Laura seis meses depois do noivado, uma semana antes do casamento. Aqui, encerro estes capítulos de meu romance com a Laura. A família já bem aumentada, com netos e bisnetos, a Laura e eu gostaríamos de ter comemorado as Bodas de Ouro na mesma cidade e igreja, mas era impossível. Com o decorrer dos anos, os episódios multiplicaram-se de tal maneira, que não sinto mais disposição para registrá-los. Até nem sei mesmo como tive ânimo de rabiscar estes episódios de meu romance com a Laura, talvez de nenhum interesse para ninguém, senão para mim que os vivi feliz e por longos anos.

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